sexta-feira, 30 de maio de 2008

REVOLUÇÃO DOS CRAVOS

Como que a querer dar resposta às preocupações sentidas por alguns responsáveis políticos, relativamente à falta de participaçÃo e até desconhecimento da vida política e social, especialmente no que se refere ao 25 de abril, as comemoraçoes deste ano, da REVOLUÇAO DOS CRAVOS, pareceram-me exemplares. Veja-se o realce dado às mesmas pela RTP 1 e 2, que nos proporcionaram diversos programas-reportagens, entrevistas, concertos- de muito bom nível.Do espectáculo principal gostaria de realçar um momento que me tocou em especial. Foi o poema de José fanha “EU SOU PORTUGUÊS AQUI”, dito pelo próprio, e que contitui uma verdadeira marca genética do 25 de Abril. Gostaria de o deixar registado como recordaçao e incentivo às gerações mais novas e também à gente do meu tempo.

Eu sou português
aqui
em fome e terra talhado
feito de barro e carvão
rasgado pelo vento norte
amante certo da morte
no silêncio da agressão.

Eu sou português
aqui
mas nascido deste lado
do lado de cá da vida
da miséria repetida
do lado do sofrimento
do pé descalço
do vento.

Nasci
deste lado da cidade
nesta margem
no meio da tempestade
durante o reino do medo.
Sempre a apostar na viagem
quando os frutos amargavam
e o luar sabia a azedo.

Eu sou português
aqui
no teatro mentiroso
mas afinal verdadeiro
na finta fácil
no gozo
no sorriso doloroso
no gingar dum marinheiro.

Nasci
deste lado da ternura
do coração esfarrapado
eu sou filho da aventura
da anedota
do acaso
campeão do improviso
trago as mãos
sujas do sangue
que empapa a terra que piso.

Eu sou português
aqui
na brilhantina em que embrulho
do alto da minha esquina
a conversa e a borrasca
eu sou filho do sarilho
no gesto desmesurado
nos cordéis do desenrasca.

Nasci
aqui
no mês de Abril
quando esqueci
toda a saudade
e comecei a inventar
em cada gesto
a liberdade.

Nasci
aqui
ao pé do mar
duma garganta magoada no cantar.
Eu sou
a festa
inacabada
quase ausente
eu sou a briga
a luta antiga
renovada
ainda urgente.

Eu sou português
aqui
o português sem mestre
mas com geito.
Eu sou português
aqui
e trago
o mês de Abril
a voar
dentro do peito.

José Fanha

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