segunda-feira, 26 de abril de 2010

Cumprir Abril

"Neste dia que hoje aqui nos reúne, a homens e mulheres de sensibilidades políticas diferentes, mas todos, sem excepção, em homenagem aos mesmos valores e princípios, da liberdade, da solidariedade, da igualdade e da justiça, entre outros, a melhor forma de cumprir a memória de Abril é honrar a história do nosso povo, a história do nosso País.
Portugal é, desde a sua fundação, um país erigido sobre a coragem, a persistência e a luta do nosso povo. É um país que resulta de uma soma continuada de conquistas. O povo português vai muito além-fronteiras, como sempre foi, com as lágrimas e o suor derramados na luta pela conquista de um amanhã melhor. Tenho orgulho em ser portuguesa, em pertencer a um povo de gente simples, humilde, inteligente, afável e trabalhador.
Já deixámos a nossa marca por diversas vezes na História dos povos. Nunca o esquecer, recordá-lo e transmiti-lo é fazer viver Portugal, é fazer viver o espírito de um povo nobre e grandioso, que se pode orgulhar de si próprio no Mundo em que se situa. Recordemos a nossa vocação marítima, que nos permitiu desbravar o caminho das Descobertas, abrindo-o ao Mundo. Recordemos a implantação da República, em 5 de Outubro de 1910, pondo fim a uma monarquia de séculos, sustentada sobre a opressão de tantas e tantas pessoas. Recordemos o Estado Novo, no qual se suprimiram as liberdades democráticas, em nome de uma pretensa melhor governação, como se o povo português não fosse capaz de tomar conta de si mesmo. Recordemos, por fim, o 25 de Abril de 1974, pelo qual se restabeleceu em Portugal um regime democrático, um Estado de Direito, que reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência, à luta contra todas as formas de opressão.
Mas recordemos também que nos dias esquecidos de humanidade, há quem tenha frio, e fome, e carência de um afecto. De um só afecto. Há quem esteja despido do calor de um agasalho, de um abraço de esperança, de um prato com comida. Nos dias em que somos umbigo, há quem chore lágrimas sem verter uma só, há quem esteja lá... e não cá! Dar a mão e o coração é sermos mais além, é sermos mais Pessoa.
A conquista da liberdade começa com cada um de nós, na nossa própria casa. Começa junto da nossa família, dos nossos filhos, dos nossos amigos, no nosso trabalho. É uma conquista constante, que não está fechada, que não está terminada.
O 25 de Abril marca uma importante etapa neste processo contínuo, que apenas foi alcançada graças à luta de muitos homens e mulheres, graças à coragem de quem não se vergou ao medo, à intimidação, à agressão, graças à dedicação e à bravura de quem, mesmo colocando-se a si e à sua família em perigo, empenhou o seu tempo e a sua vida a construir uma sociedade mais justa, uma sociedade melhor, a sociedade onde hoje podemos dizer: Viva a Liberdade!
É por ele que uma família de pessoas com sensibilidades políticas diferentes se pode sentar à mesma mesa e conversar abertamente, cultivando a diversidade e o respeito pela diferença.
É por ele que podemos estar todos reunidos hoje, cumprindo Abril a uma só voz!
Não são fáceis os dias que vivemos. Não se avizinham fáceis os tempos que se aproximam. Que a liberdade que o nosso povo conquistou permita saber alcançar a responsabilidade da cidadania, a responsabilidade que cada um de nós deve ter no seio da sociedade em que vive. Todos devemos ser exemplares.
Enquanto cidadãos, temos o direito de permitir que o amanhã seja possível; temos o direito de permitir que os nossos filhos possam desenvolver-se enquanto Pessoas num mundo sustentável e sustentado; temos o direito a viver com a consciência de que não estamos sozinhos no mundo, pertencendo a uma teia de relações humanas onde vamos tecendo o fio dos nossos dias, com consequências no fio dos dias de todos os demais; temos o direito a respeitar-nos e a respeitar os outros; temos o direito a cultivar a diversidade e a diferença, aceitando que elas fazem parte da nossa humanidade; temos o direito a aceitar o confronto de ideias que sejam diferentes das nossas; temos o direito a ser responsáveis nas escolhas que fazemos, nos actos que praticamos, nas omissões que deixamos acontecer!
Para todos, e para os alcochetanos em especial, fica o meu sincero desejo de um presente e de um futuro mais risonho, em que todos possamos ser pessoas de pleno direito!
Muito obrigada pela vossa atenção!"
Discurso proferido no salão nobre da Câmara de Alcochete, em representação da bancada do PS da Assembleia Municipal.