terça-feira, 16 de julho de 2013

O ETERNO MENINO .

Acreditem que ainda hoje me apetece dar pontapés
nas caricas, nas latas de cerveja, em tudo que encontro, 
durante as minha deambulações, ao acaso na rua .
Esmagar as tampas, plásticos, etc., com os pés, partir
galhos secos das árvores, ou pauzinhos,

e assobiar sempre, 
sempre, 
trauteando canções conhecidas, 
ou inventando novas melodias ,
o que fazia durante as longas e chatas aulas prácticas
que era obrigado a frequentar no IST .

Mas melhor ainda, é imitar os pássaros, com os meus 
trinados selvagens, deixando a passarada boquiaberta e
confusa . 
Alguns tentam retorquir-me, mas confesso que
não sei o que dizem .

Fazer bolinhas de pão, cola ou plasticina,
tirar macacos do sótão, às escondidas .
Dizer palavrões, ou palavras desconexas, para chocar 
as pessoas, como recurso para chamar a atenção dos
outros .

Dizer a verdade sempre, mesmo com o risco de as pes-
soas gostarem mais das mentiras adoçadas e bem dissi-
muladas .

E brincar,
brincar com as crianças,  
que é o máximo,
mas também brincar com a vida,
brincar com tudo,
brincar com a realidade tristonha, agreste, ofensiva,
com que temos que lidar dia a dia .

Nunca ri muito,
sobretudo raramente, ás gargalhadas,
e nunca a bandeiras desbragadas.

Sorrio, sim,
por dentro e por fora .
Do ridículo, da patetice, 
da seriedade pomposa,
das pessoas com muito siso,
presumidas, apagadas .

Muito siso, pouco siso .

Vejo,
observo atentamente,
vejo sempre demais,
o que está
e o que não está .
Vejo muitas coisas que ninguém mais vê ;
vejo monstros nas nuvens,
rostos nas manchas dos muros e paredes,
animais nas cascas das árvores.
Digamos,
que vejo quase tudo o que quero .

Gosto de trocadilhos,
dos jogos de palavras,
colecciono tudo com alguma paixão,
quando era puto e ia ao médico,
davam~me santos, caixinhas, 
serrinhas das ampolas,
tudo guardava,
e ainda guardo .

Mas  maior prazer era não ter aulas,
o professor adoecer,
ser dispensado por qualquer razão,
ou nos dias gloriosos das várias greves em que participei .

E  fazer bonecos,
sempre,
nas aulas,
nas reuniõe de trabalho,
ou nos ócios sem fim,
desde que houvesse 
onde se pudesse escrever,
com qualquer coisa que pudesse riscar .

Quantas vezes tive que travestir-me 
de adulto bem comportado,
de pessoa atenta e respeitosa,
sempre à espera que surgisse
uma janela de oportunidade,
para raiar a brincadeira .

Por isso,
apesar de tudo,
agradeço á vida
o que me proporcionou .

Com um sorriso triste nos lábios .
.