quarta-feira, 2 de agosto de 2017

O ELOGIO DO ÓCIO .

Que bom é ter um dever,
e não o cumprir .

Fernando Pessoa

Quando eu tinha mais vagar, muito gostava de ver os 
outros a trabalhar, e eu sentado para ali, horas a fio, 
como se estivesse a ver um filme real .
Chegava a faltar às aulas para me deliciar com tão inu-
sitado espectáculo, e completamente de borla .

Muito gostava de ir para o areeiro, nas traseiras da 2ª.
Circular, em construção, ver o gigantesco buraco, uma 
coisa digna de ser vista, onde os homens, quais formigas,
iam deitando a areia para o fundo, sempre em risco de
serem eles a cair no abismo .

Era esse o filme que passava nessa cratera, junto ao Pote
de Água . O lugar deve ter sido completamente arrasado .

Depois, assisti àquilo que eu chamo as 

Obras do Século :

O rasgar da Av João XXI, dos dois lados .
De um dos lados, desmantelando a enorme Fábrica de Ce-
râmica, abrindo caminho para os lados do Campo Peque-
no . e depois, rasgando a montanha, do lado da Av. Gago
Coutinho .
Meses após meses, centenas de camiões faziam uma bicha 
contínua, durante todo o dia, carregando terra e entulho, 
não sei para onde .

Morava mesmo sítio, e já estava viciado nas obras .
Todos os meus ócios, acorria a deliciar-me com aquela
barafunda, e aquilo nunca mais tinha fim .

Lisboa tinha-se expandido para outro lado e criado novos 
Bairros - Chelas, Olaias, Bela Vista, Relógio, e por aí fora .
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