Com a crónica publicada no Diário de Notícias, da autoria de
João Manuel Tavares, e retomada por Mário Garcia, no blog
Descrédito, damos por encerrado o tema M. Alegre e o Day After.
Atendendo ao 'diálogo' que se vai fazendo por este blog, não resisto em citar na íntegra o artigo de João Manuel Tavares no DN de hoje, «Alegre Explicado às Crianças»: «Inebriados pela sua vitoriosa derrota, Manuel Alegre e respectiva corte correm o risco de se entusiasmar. Os 20 por cento que obtiveram no último domingo são um resultado surpreendente e, em múltiplos sentidos, admirável, mas convém ter os pés assentes no chão - eles não se devem a nenhum "movimento cívico"; não se devem a uma súbita irrupção de "cidadania"; não se devem às estátuas osculadas; não se devem às 857 declamações da Trova do Vento que Passa; não se devem à incontinência necrológica; eles não se devem, sequer, a qualquer suposta independência partidária, uma alucinação tendo em conta que Manuel Alegre sempre foi um homem do PS e um barão de Coimbra.
A que se devem, então? Devem-se ao facto de o poeta do Mondego se ter apresentado às eleições presidenciais na condição dupla de homem ofendido e de político inofensivo. Esta mistura fez maravilhas nas urnas. Por um lado, Alegre vestiu a pele do sacrificado, do amigo apunhalado por Soares, do homem traído pelo velho compagnon de route, o Júlio César cá do pedaço. Por outro, procurou fazer uma campanha "pela positiva", sem dizer mal de quem quer que fosse (incluindo do "traidor") - e o povo, já se sabe, comove-se sempre com mártires silenciosos e exemplos morais. O homem exibiu uma manifesta impreparação para o cargo durante os debates televisivos, mas como também nunca ninguém acreditou que ele iria ser eleito, votar em Alegre era tarefa fácil. Suponho que algo semelhante a beber uma cerveja sem álcool dá conforto à goela e não se sentem os efeitos.
Agora, ver neste epifenómeno um novo Portugal a nascer, ver em Manuel Alegre o bardo que irá indicar o verdadeiro caminho à nação, só pode ser da ordem do delírio. Nada no discurso de Alegre é novo. Nada remete para o futuro. Da mesma forma que Portas vestia em campanha a pele do Paulinho das feiras, Alegre disfarçou-se de Manelinho das estátuas, numa variação sobre temas patrióticos e generalidades políticas com um cheiro insuportável a naftalina. Uma lufada de ar fresco? Há mais ar fresco em hora de ponta junto ao asfalto da Segunda Circular.»