sexta-feira, 23 de junho de 2017

O MENINO DE OIRO .

Eu tinha umas asas brancas
Asas que um anjo me deu
Quando estava cansado da Terra
Batias e voava ao Céu .

Toda a gente gabava os meus lindos  caracóis loiros .
Um dia levaram-me ao barbeiro, sentaram-me no banco suplente 
e cortaram-mos .

Lá se foi a minha meninice para o caixote do lixo, varrida para 
chão da barbearia .

Deve ter sido o primeiro acto de hostil com que fui mimoseado, e no
entanto, tratou-se  simplesmente de uma questão de higiene .  

Cresci entre avós e tios, sempre na vadiagem, no meio das brincadei-
ras inocentes, que inventava a todo o momento .

A minha Santa Mãe trazia mais um irmão para casa, de modo que
eu tive que me fazer à vida bastante cedo .
Rapidamente era considerado apto para todo o serviço .

Não pertencia a nenhum gang da malandragem, nem nenhum grupo
de malfeitores organizado . 

Era um um patife autodidata, autónomo, mas que ia a todas. 
Onde houvesse confusão, lá estava eu dando a minha colaboração 
desinteressada .

Como estava sempre a mudar de quartel, nunca tinha tempo para fa-
zer grandes amizades, e não conseguia subir na escala dos malandros .

Mas, como praticava em diversos teatros de operações,  rapidamente 
adquiria a prática para acamaradar  em qualquer grupo, e ia ganhando
experiência para o futuro .

Era uma espécie de capital de risco .
.

Agora, tantos anos depois,  com os cabelos brancos a rarear e a memó-
ria a falhar, já não tenho ninguém com quem brincar.
Brinco com a minha gata, A BRANQUINHA, faz-me companhia, vai
buscar os brinquedos que depôe ao pé de mim, à espera que a brincadei-
ra comece . Como acorda muito cedo, pode estar horas ao pé de mim e
só dá sinal quando eu dou sinal de vida .
Joga bem com as quatro patas e defende com as mãos .
Provoca-me quando páro, e só brinca quando estou a ver .
Joga à apanhada, e sempre que visto o casaco, ela põe-se à porta, para a
deixar um bocadinho .
Anda pelo patamar e desce até ao primeiro patamar .
Sempre que foi mais longe, assustou-se muito e tive que agarrá-la para a 
trazer para casa .
Se estã frio, dorme abraçada a mim, se está calor sabe instintivamente onde
encontrar a melhor corrente de ar .
Às vezes acordo mal disposto durante a noite  e ela segue-me lentamente, 
como a querer ajudar .
Arranjei uma pequena ajudante de enfermeira ...
.