sábado, 11 de junho de 2016

PEREGRINAÇÃO - 3 .

Nunca fui habituado a estudar  acompanhado ou em
cafés . Não que eu fosse de estudar muito . 
Aprendia sobretudo nas aulas, e isso ia dando para as enco-
mendas. 
Só na preparaçãodos exames do 7º. ano, que tinha de ir fazer 
na cidade da Guarda, é que tive de acelerar um pouco mais .
Então é que tive de estudar a sério, pois o desafio era grande .

Estudar sempre foi uma maçada, 
já dizia o Pessoa .

Levantava-me bem cedinho (a cotovia),
e ia estudando pelas ruas da cidade, sem encontrar vivalma e
depois regressava para o pequeno almoço que a minha Mãe tin-
ha deixado à minha espera .

Já em Lisboa,
é que encontrei o mundo mágico dos cafés, 
um mix de sala de estudo, tertulia e lugar de descanso e de lazer .

Havia cafés de toda a espécie, para todos os gostos e para todos 
os patrões e empregados,
uns para estudar isolado, como num castigo, outros em grupos 
barulhentos e na maior confusão, que afugentávamos toda a gen-
te em redor, sobretudo quando se aproximava a hora do almoço .

 Cafés finos da alta, com os fregueses à coca de boas gorjetas,
outros mais modestos, que ajudavam a fazer andar um pouco a 
máquina registadora . Em regra, eram café ja´mais na periferia
da cidade .

Dos afamados, alguns deram em bancos, 
outros em igrejas, outros ainda, lugares de 
diversão e pouca vergonha .

Muitos desapareceram, foram à vida, foi 
uma vingança do chinês .

Durante a semana, e da parte da noite, não tínhamos grandes 
problemas com o acesso aos cafés .

Pior era ao fim de semana, com os estabelecimentos pejados
de gente, curtindo as esplanadas, ou refugiadas no quentinho 
do seu interior .

Era então que tinha lugar a peregrinação,
de lugar em lugar, de café em café, de esplanada em esplanada,
sem licença para nos acoitar assentados em frente de uma bica
e com os livros escondidos .

Era um tormento querer trabalhar e não poder,
e, quantas vezes regressávamos ao lugar de partida, sem ter sa-
boreado uma única palavra . 

E íamos jantar ... 
.