E de novo regresso
aos cafés de culto .
Andei por Lisboa inteira adentro, com o objectivo,
nem sempre conseguido, de estudar alguma coisa .
Cheguei a fazer uma lista dos café de onde que era
escorraçado, enxotado para o olho da rua .
Passei pelo Império, pelo Londres, pela Mexicana,
pela Copa Cabana, pelo Roma, e por tantos outros .
Era preciso estudar, que diabo,
mas o que eu gostava mais era da conversa fiada, das
piadas com que nos degladiávamos uns aos outros .
Tudo servia para interromper a atenção,
ver quem entrava, quem saía, quem ficava,
arranjar uma pausa para a bica, aumentar o tempo do
lanche, fumar um cigarro, ir à casa de banho , e co-
mo não actuávamos em uníssono, a tarde era passada
com pouco rendimento .
Sempre gostei de curtir o café, o café espaço, e tam-
bém o café expresso, antes designado uma bica bem
tirada .
Iniciei-me na Covilhã, quando fui viver para o Bair-
ro da Estação ( do Combóio, junto ao Tribunal Novo) .
Ali ficávamos pasmados tardes inteiras, à espera que
o tempo fluísse devagar, ou aguardando uma jogatana
de futebol .
Nessa altura era eu um estudante degredado, estudava
de dia e de noite, mas ainda me sobrava tempo para a
malandragem .
A Covilhã era uma cidade extremamente classista, no
verdadeiro significado do termo .
O principal café da cidade, o Montalto, tinha as mesas
atribuídas por sectores de actividade - industriais, advoga-
dos, professores, bancários, etc .
De quando em vez, ou porque faltasse um professor, ou
porque tínhamos feito gazeta às aulas, percorríamos a par-
te velha da cidade e, em fila indiana ocupávamos todo o ca-
fé, antes de os senhores virem tomar a seu sagrado café .
Era uma cena de criar bicho .
Acabávamos sempre por abandonar o recinto, não sem
antes agitarmos um pouco aquela cidade morna e idiota .
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