quarta-feira, 25 de maio de 2016

A VILA DE SEIA .

Quando era miúdo, o meu mundo restringia-se à Vila de Seia,
Vila/Cidade à beira serra plantada .
O seu centro era o Castelo, de que restava só o nome e a me-
mória, pois que nada existia da sua edificação .

Era ali que se maquinavam batalhas, aventuras, experiências,
descobertas, reais ou imaginárias, dentro dos calções rasga-
dos e com os joelhos deitados abaixo .

Havia depois a Praça, o coração que bombava as gente para
em todas as direcções, com a Fonte das Quatro Bicas, a Ca-
pela Romana, as lojas mais importantes e o consultório do
Dr. Melo, Deus, o Diabo numa só pessoa .

Médico que a todos tratava sem levar dinheiro, e se tivesse 
posses, pagava mais tarde em géneros .

O médico tinha já naquele tempo, nos anos 40,  aparelho de 
Raios X, um dispositivo de radioscopia, que permitia ver os 
corpos por dentro, um dos melhores de todo o Concelho,  e 
que atraía gente de todas as redondezas .

A Tia Lurdes, o terror do consultório, distribuía injecções a 
torto e a direito . A primeira que levei, fugi a sete pés, foi um 
guarda republicano que me devolveu ao consultório, para 
cumprir a penitência .

Do coração da Praça, irradiavam várias artérias, para a Serra,
para o Rio(Sena), para Gouveia e para S. Romão .

A Praça, o Correio, a Papelaria Havaneza, a Câmara, o Grémio,
a Empresa Hidroeléctrica, a Camionagem dos Hermínios, a Es-
cola Primária e o Cemitério, eram os focos de toda uma activida-
desenvolvida em torno de nós .

Ao alto, o castelo permitia iluminar os fiéis, e proporcionar-
 uma panorâmica a 360 graus em torno das terras distribuídas
das à nossa volta, como num imenso presépio - Arrifana, Vodra, 
Vales, S. Romão, Pinhanços, Santa Marinha, Aldeia da Serra, 
mais além, Gouveia e Oliveira do Hospital .

Ficava por aqui o meu Universo .

Foi nele que me aventurei em numerosas gestas, muitas à re-
velia dos meus familiares .

Já então um miúdo selvagem, soltando gritos de liberdade .
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