Triste fado ser Beirão .
Fora dos grandes centros populacionais das terras beirãs, a
grande maioria das suas populações, vivia quase exclusiva-
mente uma agricultura de subsistência e da pastorícia .
Havia sempre uma pequena horta familiar, em regra com
plantação de vinha e, muitas vezes, de um pinhal repartido .
Nas serranias havia sempre um poço ou uma mina para a re-
ga e para as necessidades primárias .
A alimentação provinha do pedaço de terra comum e era com-
plementada pela criação de animais de pequeno porte .
A existência de porcos era mais rara e só os mais abastados
conseguiam lá chegar .
Levava-se o vinho a fazer na adega e o azeite no lagar .
Corta-se um ou dois pinheiros para a lenha, e o mato para fa-
zer a cama dos animais, que mais tarde era transformada em
estrume, para alimentar as terras.
Era a maneira ancestral de evitar
os incêndios florestais .
Havia fruta com fartura, de todas as variedades e preparada
de diversas maneiras, compotas, frutos secos, sumos .
Era o que se chamava uma alimen-
tação mediterrânea, mas em pobre
ou remediado .
Havia coisas que era necessário ir abastecer na mercearia ou
no talho .
Era portanto viver num sistema de trocas (era eu que vendia os
molhos de couves e outros vegetais, angariando algum provento
para a casa ) .
Uma tia minha era doceira, trazia os produtos necessários para
casa, e apresentava depois deliciosos bolos de encher o olho das
vizinhas . A gente, os mais miúdos, regalava-se em provar, lim-
pando a massa com o salazar e tendo direito a um pequeno pe-
daço da guloseima .
O resto era suprido pelo ordenado do meu pai .
Contado desta maneira, parecia que vivíamos no Paraíso Terreal .
(devo lembrar que quando eu nasci, a Grande Guerra ainda iria
durar mais três longos e dolorosos anos ).
A pouco e pouco, a vida iria transformar imenso, até se atingir o
holocausto das serras e das terras das beiras .
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Quando do Big Bang, Deus criou o Mundo, criou os 4 elementos
da Natureza ,
Terra, Água, Ar e Fogo .
Todos importantes e cada qual com a sua finalidade .
Parece que o fogo foi somente para assustar os humanos, mas ve-
io a descobrir-se mais tarde, que tinha muitas outras utilidades de
grande importância .
Quando milhões de anos mais tarde, foi descoberto pelo Homem,
o nosso Planeta pulou e avançou, como bola colorida, entre as
mãos de uma criança .
O fogo é pois uma coisa boa .
O que é mau é a maneira errada e preversa como é utilizado e
abusado .
Voltando à realidade,
desde criança que convivo com a realidade dos fogos florestais .
Vivia à porta do Quartel de bombeiros da minha terra . Era sem-
pre o primeiro a aparecer, quando a sirène tocava , um toque para
a vila, dois toques, quando o fogo era fora .
E apareciam a correr os bombeiros a ataviar-se à pressa, até partir
o primeiro carro de socorro .
Ainda não se sabia bem onde era o fogo, mas como havia 4 estra-
das, para a Serra, para S. Romão, Nelas ou Gouveia,
nós, os mais miúdos deitava-nos a adivinhar o caminho seguido .
A nossa inocência marcava a terra com um acontecimento importante,
e não tínhamos ainda a noção dos perigos vividos, quer pelos bombeir-
os, quer pela povoações que circundavam as serranias .
Tudo fazia parte de um jogo, mais uma diversão aproveitada pelos lon-
gos dias de férias .
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Porque ardem as Serras ?.
Sempre houve fogos florestais .
A prova mais evidente é que em todo o planalto central já só existem
pedras .
Existe alguma vegetação rasteira, disseminada nalguns sítios, como é o
caso Nave de Santo António, e numa imensa quantidade de pequenos
covões, de que o Covão da Ametade é o mais conhecido, pois coincide
com a nascente do Rio Zêzere .
No Verão , os rebanhos sobem à Serra e por aí permanecem até à che-
gada dos primeiros gelos, protegidos pelos cães Serra da Estrela, cães
especiais, treinados para a defesa e guarda dos animais e dos pastores .
Leões com corações de passarinho .
No Inverno, recolhem às aldeias, longe das ameaças dos lobos .
Para quem estiver interessado por este tema, aconselho a leitura do ro-
mance de Ferreira de Castro,
A LÃ E A NEVE.
Certamente que os pastores, na sua labuta, serão responsáveis, por
um ou outro fogo, mas sempre de pequena dimensão .
As causas dos fogos florestais são tantas e tão diversificadas, em es-
pecial os de grande dimensão, que agora todos andam em busca das
causas e dos responsáveis, tendo o vício chegado à Presidência da Re-
pública .
Devo confessar que imensos actores, de várias origens, de vários ofí-
cios, de todos os graus académicos, de muitas instituições, sabem o su-
ficiente para apontar aquelas causas dos incêndios, bem como pode-
riam ajudar a solucionar alguns dos problemas mais candentes dos fo-
gos, assim houvesse real interesse para minorar a tragédia vivida, em
maior ou menor grau, todos os anos pelos meses de Verão .
A memória dos homens é curta,
e a cupidez de alguns
não tem limites .
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