Dizem que se nasce sòzinho
e que sòzinho se morre também .
Mas acho que passamos a maior parte da nossa vida sós,
muitas vezes com a vaga sensação de estarmos acompan-
hados .
Não podemos entrar na cabeça dos outros, mas também
não deixamos que devassem a nossa intimidade .
Vivemos de pequenos equilíbrios instáveis, tanto mais ins-
táveis, quanto a proximidade dos que nos rodeiam parece
mais forte .
A partilha é muito importante na vida, mas só até um certo
patamar . Existe um ponto de viragem, em que começamos
a sentir-nos asfixiados e asfixiantes .
A cumplicidade existe, sim existe, mas é de pouca duração .
A nossa personalidade acaba sempre por vir à tona e
eclipsar a dos outros .
Claro que há situações em que as pessoas estão mais per-
meáveis à partilha de sentimentos,
o enamoramento, a paixão, o aparecimento de um filho,
a dor, a doença, a morte, as dificuldades da vida,
mas com o tempo, desaparece o estado de graça .
É uma punção da natureza .
Como na vida animal .
Em regra, são as fêmeas que cuidam das crias,
e os machos tendem a isolar-se, na caça pela sobrevivência,
na disputa do território, na luta pela companheira, no com-
bate pela selecção natural .
A humanidade vai cumprindo a sua curva helicoidal, criando
regras para amaciar os comportamentos sociais,
mas a nossa raiz instintiva, em momentos de grave crise, aca-
ba por vir à superfície .
É então que o (pre)conceito de igualdade se torna um tanto
ofuscado, mesmo deslocado, cavalgando a realidade imaginá-
ria .
O raciocínio perde sempre para o instinto .
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